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O que é Fascismo, o que come, onde mora?
Por Gilson Moura Henrique Junior
Segundo a Wikipédia:
“Fascismo é uma forma de radicalismo político autoritário nacionalista que ganhou destaque no início do século XX na Europa. Os fascistas procuravam unificar sua nação através de um Estado totalitário que promove a vigilância, um estado forte, a mobilização em massa da comunidade nacional, confiando em um partido de vanguarda para iniciar uma revolução e organizar a nação em princípios fascistas. Hostil à democracia liberal, ao socialismo e ao comunismo, apesar de semelhanças com os últimos dois. Os movimentos fascistas compartilham certas características comuns, incluindo a veneração ao Estado, a devoção a um líder forte e uma ênfase em ultranacionalismo, etnocentrismo e militarismo. O fascismo vê a violência política, a guerra, e o imperialismo como meios para alcançar o rejuvenescimento nacional e afirma que as nações e raças consideradas superiores devem obter espaço deslocando ou eliminando aquelas consideradas fracas ou inferiores, como no caso da prática fascista modelada pelo nazismo”.
Ou seja, fascismo é um processo de radicalização da centralização do estado, é uma ampliação aguda do estado central e das identidades em um determinado estado-nação, ideologização das diferenças étnicas, ampliação ao máximo de um governo autoritário, a ponto de alguns autores incluírem-no sob a categoria de totalitarismo, profundo anticomunismo e extrema violência contra opositores. Acrescente a isso uma percepção orgânica da sociedade em simbiose com o estado, ou seja, estado e sociedade tornam-se um mesmo organismo vivo, cuja concepção de condição saudável é o tratamento da dissidência e de elementos dissonantes do ideal de pureza social como infecção, ou seja, passíveis de serem eliminados, “curados” ou “reeducados”, o que volta e meia são sinônimos na prática.
Por que discutir e definir o que é fascismo?
Porque o uso comum do termo mistura na qualificação de fascista todo tipo de elementos, dos mais autoritários aos menos confundindo ao fim e ao cabo a categorização chamando do PSTU ao Bolsonaro de fascistas, o que leva a uma confusão dos diabos pra terminologia e no fim, para a própria luta antifascista.
Se tudo é fascismo, nada é.
Da mesma forma misturar Stalinismo e comunismo com nazismo e fascismo é uma bela e estúpida desconstrução da nomenclatura em nome da generalização vulgar. Pode funcionar como ofensa, mas funciona melhor como desserviço.
As definições não precisam ser exatas neste caso por uma questão de apego à terminologia, mas por uma questão de gravidade do combate ao inimigo. Ao definirmos todos como fascistas esvaziamos o peso histórico e político do real fascismo.
Há uma diferença concreta entre o militonto idiota que segue lobão pedindo impeachment de Dilma e do militante do PSTU que age com autoritarismo silenciando a dissidência pro militante nazifascista que agride negros, gays e tudo o que ele considera inferior.
Há tanta diferença quanto entre o Alckmin mandando a PM bater e o que faria Bolsonaro, um fascista concreto, se comandasse a polícia. Se Alckmin é daninho e muito autoritário, o que Bolsonaro representa em comparação com o autoritário Alckmin precisa de multiplicação por mil pra ser compreendido. Se Cabral, Alckmin, Dilma e Aécio são autoritários, como via de regra todo estado é e todo governador ou presidente são, o fascismo é isso multiplicado por cem mil.
Imagine um quadro horroroso de morte de indígenas, negros, gays, mulheres, dissidentes? Tipo, sei lá, a ditadura militar Brasileira ou Pinochet? Imaginou? Pois é Mussolini e Hitler foram piores.
O que prega o fascismo é pior do que prega o pior de nossos exemplos autoritários à mão. E o fascismo usa essa confusão pra se imiscuir entre a direita mais moderada, dita democrática, e forçar seu crescimento pela banalização.
O fascismo usa a banalização do termo “fascista” pra transformar todos em idênticos a ele, e se todos são fascistas, ninguém é.
Claro que na sanha, no sangue, chamar o PM calhorda de fascista é do jogo, mas não é bom usar em divergências políticas com elementos de fora do campo fascista e até de fora do campo da direita clássica.
A não ser que ditador tenha virado elogio, transformar ditadura em fascismo esvazia o peso histórico do fascismo.
A Comuna de Paris (Kropotkin)
Fonte: Protopia
No dia 18 de março de 1871, o povo de Paris levantou-se contra o governo que desprezava e detestava e declarou que Paris era agora uma cidade independente, livre e dona do seu destino.
Essa derrubada do poder central aconteceu sem a costumeira encenação teatral que normalmente acompanha as revoluções. Não houve tiros e o sangue não chegou a correr sobre as barricadas. Quando o povo armado saiu às ruas, os governantes fugiram, as tropas abandonaram a cidade e os funcionários civis refugiaram-se apressadamente em Versalhes, levando tudo o que podiam. O governo se evaporou como uma poça de sangue estagnado em meio à brisa da primavera e no dia 19 de março Paris se viu livre da sujeira que a havia maculado, sem que tivesse corrido quase nenhuma gota de sangue de seus filhos. Entretanto essa mudança assim obtida deu início a uma nova era na longa série de revoluções pelas quais os povos começavam a trocar a servidão pela liberdade. Sob o nome de “Comuna de Paris”, nasceu uma nova idéia que havia de se tornar o ponto de partida para revoluções futuras.
Como acontece sempre, essa idéia não tivera origem no cérebro de um individuo isolado, nem era fruto das reflexões de um filosofo. Ela surgiu do espírito coletivo, nasceu no coração de toda a comunidade. Mas a princípio era algo vago e muitos daqueles que agiram e deram suas vidas para defendê-la não a viam com os mesmos olhos com que hoje a vemos. Eles não percebiam o alcance da revolução que haviam criado ou as possibilidades do novo conceito que acabavam de pôr em prática. Só depois é que começaram lentamente a entender suas conseqüências. Só mais tarde, quando começaram a refletir sobre o novo conceito é que ele se tornou mais claro e preciso e a beleza, justiça e importância dos resultados obtidos puderam ser avaliados.
Durante os cinco ou seis anos anteriores à Comuna, o socialismo ganhara novo alento graças ao rápido desenvolvimento da Associação Internacional de Operários. Em suas filiais regionais ou durante os congressos que realizava, os trabalhadores da Europa se encontravam e trocavam idéias sobre a questão social, algo que nunca tinham feito antes. Entre aqueles que percebiam que a revolução social era inevitável e que se preparavam ativamente para vivê-la, surgiu um problema que deveria ser resolvido antes de qualquer outro: O atual desenvolvimento da indústria forçará a eclosão de uma grande revolução econômica; essa revolução abolira a propriedade privada, fazendo com que todo o capital reunido pelas gerações pregressas passe a ser um bem comum a todos.
Após essas mudanças no sistema econômico, qual seria a melhor forma de organização política? “Não poderá ser uma agremiação apenas nacional respondeu a Associação Internacional mas deve estender se além das fronteiras artificiais e de todos os limites naturais.” Logo essa idéia grandiosa apossou-se do coração e do cérebro dos homens e, embora venha sendo perseguida desde então pelos esforços conjuntos de reacionários dos mais variados tipos, permanece viva ainda hoje. E quando as vozes dos povos em revolta tiverem removido os obstáculos que impedem o seu progresso, ela ressurgira mais forte do que nunca… Mas ainda faltava descobrir quais deveriam ser os elementos que iriam compor essa gigantesca associação. A essa pergunta, foram dadas duas respostas que expressavam duas correntes distintas. Uma falava em estado popular; outra, em anarquia.
Os socialistas alemães defendiam a idéia de que o estado deveria apossar-se de todos os recursos e riquezas acumuladas, distribuindo-as entre as associações de operários e mais, que estes deveriam tomar a si as atividades de produção e comércio e, de uma maneira geral, todas as atividades da sociedade.
A isso os socialistas latinos, que tinham atrás de si uma grande experiência revolucionária, responderam dizendo que seria um milagre se tal estado pudesse um dia existir, mas que, se isso chegasse a acontecer, certamente ele acabaria por se tornar a pior das ditaduras. Esse ideal de criar um Estado todo poderoso e bom é apenas uma cópia de algo que existiu no passado, diziam, e confrontavam-no com a idéia de um novo ideal, a anarquia, isto é, a abolição total do estado, um sistema em que todas as formas de organização social, da mais simples à mais complexa, fossem obtidas através de federações livres, reunindo grupos populares de produtores e consumidores.
Até mesmo os socialistas mais liberais admitiram que a anarquia sem dúvida representava um tipo de organização bem superior àquela pretendida pelo estado popular. Mas, diziam eles, o ideal anarquista é algo tão distante, que não podemos perder tempo com ele agora.
Ao mesmo tempo, a verdade é que a teoria anarquista necessitava de uma forma de expressão que fosse clara e concisa, uma fórmula ao mesmo tempo simples e pratica, em que pudesse demonstrar suas origens e incorporar suas concepções, onde provasse que era apoiada por uma tendência que já existia antes entre o povo. Uma federação de associações operárias e grupos de consumidores que não levasse em conta as fronteiras e se mantivesse independente em relação aos estados já existentes ‘parecia urna idéia demasiado vaga: e mais, era fácil perceber que ela não poderia satisfazer totalmente a infinita variedade de exigências humanas. Era preciso encontrar uma fórmula mais simples, mais facilmente compreensível, que tivesse uma base firme e bem enraizada na vida real.
Se o problema se resumisse apenas a encontrar a melhor forma de elaborar urna teoria, poderíamos dizer que as teorias, como teorias, não são assim tão importantes. Mas enquanto uma nova idéia não encontra uma forma de expressão clara e precisa, a partir de fatos concretos, tais como eles existem na realidade, ela não conseguirá apoderar-se da mente dos homens. Nenhum homem se animará a mergulhar no desconhecido se não for animado por idéias positivas e claramente formuladas que lhe sirvam, por assim dizer, como um trampolim quando chegar o momento.
Quanto a esse momento, será preciso que a própria vida o indique.
Durante cinco longos meses, Paris esteve cercada pelos alemães. Durante cinco meses, ela precisou lançar mão de seus próprios ‘recursos vitais e de toda a força moral de que dispunha. Teve então idéia de sua capacidade de resistência e percebeu o que ela significava. Percebeu também que o bando de tagarelas que havia tomado o poder não tinha a menor idéia sobre como organizar a defesa da cidade ou sobre como promover seu desenvolvimento interno. Viu um governo que se opunha a todas as manifestações de inteligência daquela metrópole poderosa. Entendeu, finalmente, que qualquer governo é impotente para proteger-se das grandes catástrofes é incapaz de preparar o caminho para a evolução. Durante o cerco, a cidade vira seus defensores, os operários, sofrendo as mais terríveis privações enquanto os ociosos se regalavam em meio a um luxo insolente e, graças aos esforços do governo central, presenciara o fracasso de todas as tentativas de acabar com essa situação escandalosa. E cada vez que o povo demonstrava sinais de um desejo de libertar-se, o governo colocava novos grilhões na corrente. Essas experiências fizeram com que se chegasse naturalmente à conclusão de que Paris precisava libertar-se, tornar-se uma comunidade independente, capaz de satisfazer sozinha todas as aspirações de seus cidadãos.
Mas a Comuna de Paris não podia ser mais do que uma primeira tentativa. Iniciada ao término de uma grande guerra, espremida entre dois exércitos prontos a dar as mãos para esmagá-la, ela não se atreveu a enveredar pelo caminho da revolução econômica. Não iniciou um processo de expropriação do capital ou de organização do trabalho. Não soube ao menos avaliar os recursos da cidade. Também não conseguiu romper com a tradição de um governo representativo, nem procurou realizar dentro da comuna, o mesmo tipo de organização que, partindo do simples, chegas- se ao mais complexo, e que fora instaurada externamente pela proclamação da independência da cidade e a livre associação das federações.
E no entanto, o certo é que se a Comuna de Paris tivesse durado mais alguns meses, ela teria sido inevitavelmente levada pelas circunstâncias em direção a essas duas revoluções.
Não esqueçamos que a classe média francesa gastou quatro anos (de 1789 a 1793) em ações revolucionárias, antes que conseguisse transformar a monarquia limitada numa república. Deveríamos pois surpreender-nos ao ver que o povo de Paris não conseguiu ultrapassar de um salto a distância que separa uma comuna anarquista de um governo de espoliadores? Além disso, não devemos esquecer que a próxima revolução que, pelo menos na França e na Espanha deverá ser comunista, vai retomar o trabalho da Comuna de Paris no ponto que foi interrompido pelos massacres da soldadesca de Versalhes.
A Comuna foi enfim derrotada e sabemos muito bem como a classe média se vingou do susto que o povo lhe havia pregado ao tentar soltar as cordas que seus senhores mantinham em torno dos seus pescoços. Isso veio provar que a sociedade moderna é, na verdade, composta por duas classes: de um lado, o homem que trabalha e cede mais da metade daqui- lo que produz aos que detêm o monopólio da propriedade e que, no entanto, parece indiferente aos males que os patrões podem fazer-lhe; de outro, o ocioso, o espoliador que odeia o seu escravo e que está sempre pronto a matá-lo, como se ele fosse uma caça qualquer, um homem animado pelos mais selvagens instintos sempre que vê ameaçada a sua propriedade.
Depois de ter cercado o povo de Paris e fechado todas as vias de saída, o governo soltou sobre eles um bando de soldados embrutecidos pelo vinho e pela vida na caserna, homens que haviam sido publicamente instruídos para “acabar logo com os lobos e suas crias”.
Depois dessa orgia louca, dos corpos empilhados após esse extermínio em massa, veio a vingança mesquinha, o chicote, os ferros, os golpes e insultos dos carcereiros, a quase morte pela fome, enfim todos os requintes da crueldade. Poderá o povo esquecer esses fatos?
Derrubada mas não vencida, a Comuna renasceu. Já não é mais um sonho dos vencidos, acariciando na imaginação a bela imagem da esperança. Não! A comuna se tornou hoje o objetivo visível e definido da revolução que ruge sob os nossos pes. A idéia penetrou fundo entre as massas, que a recebe com gritos de entusiasmo. Contamos com a geração atual para fazer com que a revolução aconteça dentro da comuna, para pôr um fim ao ignóbil sistema de exploração nas mãos da classe média, para livrar o povo da tutela do Estado e iniciar uma nova era de liberdade, igualdade, solidariedade.
Dez anos nos separam do dia em que o povo de Paris derrubou o traidor que subira ao poder no crepúsculo do Império; por que será que as massas oprimidas do mundo civilizado ainda hoje sentem uma irresistível atração pelo movimento de 1871? Por que a idéia representada pela Comuna de Paris ainda fascina os operários de todos os países? A resposta é fácil. A revolução de 1871 foi, antes de mais nada, uma revolução popular, feita pelo próprio povo, surgindo espontaneamente da massa e nela encontrando seus defensores, seus heróis e seus mártires. E exatamente por ser tão “baixa”, a classe média jamais pode perdoá-la. E ao mesmo tempo, o que a tornava tão popular era seu caráter de revolução social, uma idéia certamente um tanto vaga, talvez inconsciente, mas ainda assim um esforço no sentido de obter enfim, depois de séculos de luta, a verdadeira liberdade, a verdadeira igualdade para todos os homens. Era o levante das camadas mais baixas buscando a conquista dos seus direitos.
Muitas foram as tentativas feitas para mudar o verdadeiro significado dessa revolução, representando-a como um simples esforço para retomar a independência de Paris e desse modo constituir um pequenino Estado dentro da França. Mas nada pode ser mais falso. Paris não procurou se isolar da França, nem muito menos conquistá-la pela força das armas; a ela não agradaria a idéia de permanecer encerrada dentro de suas próprias fronteiras, como uma monja num convento: o que a inspirava não era o espírito limitado do claustro. Se ousara reclamar sua independência, se tentara evitar a interferência do poder central em seus assuntos, foi porque vira nessa independência uma forma de elaborar com tranqüilidade as bases da futura organização política e de provocar uma revolução social dentro de seus próprios limites. Uma revolução que teria alterado completamente todo o sistema de produção e troca, dando-lhe como base a justiça; que teria modificado totalmente as relações humanas colocando-as em pé de igualdade; que teria renovado a nossa moral social baseando-se na igualdade e na solidariedade. Para o povo de Paris, a independência da cidade era apenas um meio, seu objetivo maior era a revolução social.
E esse objetivo poderia ter sido atingi-lo se a revolução de 18 de março tivesse seguido seu curso natural, se o povo de Paris não tivesse sido trucidado pelos assassinos de Versalhes. A verdadeira preocupação do povo de Paris, desde os primeiros dias de sua independência, foi encontrar uma idéia precisa e clara, algo que pudesse ser facilmente entendido por todos e que resumisse em poucas palavras o que era necessário para que a revolução se tornasse uma realidade.
Mas uma grande idéia não pode germinar num só dia, por mais rápida que seja a elaboração e a difusão de idéias durante os períodos revolucionários. Ela precisa sempre de um determinado tempo para que possa desenvolver-se, para que penetre na massa, transformando-se finalmente em ação e a Comuna de Paris não lhe deu tempo suficiente. Ela fracassou principalmente porque, como já observamos antes, há dez anos atrás o socialismo passava por um período de transição. O comunismo autoritário e semi-religioso de 1848 já não conseguia conquistar as mentes mais práticas e mais livres da nossa época. O coletivismo que tentará juntar o sistema de salários com a propriedade privada era incompreensível, despido de atrativos e cheio de falhas que dificultavam a sua aplicação na prática. O comunismo livre ou anarquista recém começava a tomar forma no cérebro dos operários e ainda não tinha coragem de provocar as críticas daqueles que defendiam o governo. Estavam todos indecisos. Os próprios socialistas, sem um objetivo definido em vista, não se atreviam a lançar-se sobre a propriedade privada; eles se iludiam com a desculpa que já impedira a ação de muitos outros em épocas anteriores: “Precisamos ter primeiro a certeza de que venceremos e só depois será possível ver o que pode ser feito”.
Certeza na vitória! Como se houvesse alguma forma de criar uma comuna livre sem acabar com a propriedade privada. Como se fosse possível vencer o inimigo quando as massas não estão diretamente interessadas na vitória da revolução, percebendo que ela poderá trazer bem estar moral, material e intelectual para todos! Eles tentaram consolidar a Comuna e só depois tratar da revolução social sem perceber que a única forma correta de agir seria consolidar a Comuna através da revolução social.
O mesmo aconteceu com respeito ao conceito de governo. Ao proclamar a Comuna livre, o povo de Paris proclamara também um princípio básico do anarquismo, ou seja, a derrubada do estado. Mas como o conceito de anarquismo recém começava a surgir, não tardou para que fosse contido, e logo o velho princípio da autoridade ressurgiu e o povo se outorgou um Conselho nos moldes dos conselhos municipais já existentes.
Entretanto, se admitimos que a existência de um governo central que regule as relações entre as comunas e algo totalmente desnecessário, por que deveríamos admitir que necessitamos dele para regular as relações mútuas dos vários grupos que constituem a comuna? E se deixamos que as próprias comunas diretamente interessadas decidam sobre as questões que interessam várias cidades ao mesmo tempo, por que recusar esse direito aos vários grupos que compõem cada comuna? Assim como nos parece desnecessária a existência de um governo fora da comuna, deveríamos também perceber a inutilidade de um governo dentro dela.
Mas em 1871, o povo de Paris, que já derrubou tantos governos, recém fazia a sua primeira tentativa de revolta contra o próprio sistema: conseqüentemente, deixaram-se levar pela admiração fetichista que os governos inspiravam então e criaram o seu próprio governo.
O resultado todos conhecem. Paris enviou seus filhos mais dedicados para a Câmara Municipal. Lá, perdidos entre pilhas de velhos documentos, obrigados a legislar quando o instinto lhes dizia que deveriam estar agindo entre a massa, obrigados a discutir quando era necessário agir, a acomodar-se quando a melhor política teria sido lutar e, finalmente, perdendo a inspiração que só é renovada pelo contato continuo com as massas, eles se viram reduzidos à impotência. Paralisados pela distância que os separava do povo – o centro e coração da revolução – eles próprios acabaram paralisando a iniciativa popular.
Assim, a Comuna de Paris, fruto de um período de transição, nascida sob a mira das armas prussianas, estava destinada a desaparecer. Mas pelo seu caráter eminentemente popular. ela deu origem a uma nova série de revoluções e pelas idéias que lançou tornou-se a precursora de todas as revoluções sociais. O povo aprendeu a lição e, quando surgirem mais uma vez na França os protestos das comunas revoltadas, ele já não esperara que o governo tome atitudes revolucionárias. Quando tiverem se libertado dos parasitas que os devoram, tomarão posse de toda a riqueza social disponível de acordo com os princípios do comunismo anarquista. E quando tiverem abolido totalmente a propriedade privada, o governo e o estado, irão se organizar livremente, de acordo com as necessidades indicadas pela própria vida. Rompendo as correntes, derrubando seus ídolos, a humanidade marchará em direção a um futuro melhor, desconhecendo senhores e escravos e venerando ainda os mártires que pagaram com seu sofrimento e o seu sangue naquelas primeiras tentativas de emancipação que iluminaram a nossa marcha pela conquista da liberdade.
Sobre cidades e comunidades anarquistas
Por Gilson Moura Henrique Junior
A relação entre anarquia e superação do estado é algo que compõe uma miríade de vertentes e opções. Dentre todas existem as que me parecem dominantes hoje e que compõe uma ópera de individualismo e misticismo, quase um elemento de constituição da elevação espiritual do ser anarquista, do indivíduo anarquista, e sua relação com o mundo.
A ideia de diferenciação do anarquista em relação aos demais ultrapassa os sinais pontuais presentes nas propagandas ideológicas que tratam quem não se alinha ao anarquismo como “zumbis” ou “escravos”, e segue a ideia de que ao se afastar do mundo se estabelece um “contra mundo” capaz de, por algum mistério inexplicável e jamais conscientemente estabelecendo um método de transformação, fazer com que todo mundo seja anarquista.
Essa ideia é presente em um sem número de publicações, páginas, fan pages e domina o lado virtual do mundo anarquista. É notório na virtualidade o método de propaganda ideológica que estabelece um projeto de agitação e propaganda da desqualificação da tecnologia, do mundo “normal”, das relações de poder e de todo um arcabouço de modos de vida e de pensamento como inferiores e limitados.
Se por um lado essa metodologia acerta na crítica à civilização, ela estabelece um projeto de contra hegemonia estéril que não constrói nenhuma metodologia prática de contra hegemonia concreta. Torna-se apenas um modo de vida que cria fantasias travestidas de práxis e que pouco oferecem de alternativas além do exemplo.
Essa crítica é fundamentalmente, e brilhantemente, trazida por Murray Bookchin e perfeitamente direcionada à ideia das zonas autônomas temporárias e da mistificação da retirada do mundo que cai como uma luva nas posturas anarquistas em voga.
Essa crítica é irmã da crítica ao fetiche da ferramenta estabelecido com sinal contrário contido na repulsa à tecnologia construída em torno do anarco primitivismo.
Ao estabelecer um sistema de crítica idealizada à tecnologia, no sentido de não estruturada numa lógica que analisa de forma refinada o processo tecnológico como inserido em contextos simbólicos e práticos que vão muito além da ferramenta em si, parte dos anarquistas abole o engenho como parte da transformação estrutural que buscam construir, ou seja, em última análise culpam a roda pela civilização.
Nesse meio tempo o mundo processa e estabelece parâmetros de debate e de exercício da dominação que exigem uma luta contra hegemônica para muito além da retirada do palco de parte dos atores.
Ou seja, não é que a comunidade de permacultura ou as zonas autônomas temporárias ou o louvor a um primitivismo idealizado cometam um erro universal em sua estrutura, apenas todos eles abdicam do enfrentamento cotidiano dos problemas das pessoas e das comunidades e do estabelecimento de parâmetros de pensamento e organização anarquistas no combate ao uso da tecnologia como ferramenta de dominação, do estabelecimento de paradigmas ecológicos nas organizações cotidianas, na estruturação de métodos usuais de refundação cultural a partir de elementos primários libertários, etc.
Um exemplo é a abdicação do uso de ferramentas de construção em permacultura como meios de influência em ocupações de terreno por sem tetos ou por ocupação de áreas rurais por sem-terra.
Além disso, as zonas autônomas temporárias, que é parte da influência dos movimentos Occupy mundo afora, tendem a serem elementos de fundamentação temporária de ações isoladas e não um elemento estruturado e metodologicamente estabelecido de ações de médio e longo prazo.
Tudo isso leva ao debate sobre a relação entre anarquistas e as cidades em um mundo onde a revolução urbana alcançou seu auge e estabeleceu um paradigma de ocupação urbana que supera pela primeira vez na história a população rural a partir de vinte e três de maio de 2007.
Se é correta a crítica às insustentáveis megalópoles e ao menos a busca por uma reforma urbana que as tenha como alvo para sua necessária descentralização redimensionamento, não é pela negação da urbe que teremos o processo necessário de refundação da ideia de concentração de pessoas.
Se é importante estabelecer um processo de paulatina redução das cidades ou migrações para cidades pequenas e medias, não se pode construir a partir disso a lógica de que pela ausência de alguns que tem meios de constituir esse processo, ele se resolve automaticamente.
É preciso lidar com as megalópoles a partir de suas periferias e da ausência de direitos e estrutura nelas. A base material da vida das periferias é inclusive parte do problema ambiental das megalópoles e não deve ser combatida apenas por sua negação.
Negar a megalópole não empondera e nem retira da miséria ou da falta de moradia os milhões de pobres nelas. Migrar pra comunidades livres das neuroses das megalópoles não resolve o impacto mobilidade urbana predatória na vida do mundo todo.
É fundamental estabelecer um processo de integração entre a ideia da sustentabilidade da permacultura com a resolução do problema do deficit de moradia nas mega, grandes e médias cidades.
É fundamental conceber as zonas autônomas temporárias como ferramenta de combate à lógica urbana de desocupação das praças, das ruas, do estabelecimento de zonas livres de pobres, da elitização dos espaços e da gentificação.
É fundamental estabelecer um processo que interligue as críticas à civilização como formas concretas de rediscussão dos parâmetros civilizatórios a partir da integração da perspectiva ameríndia, aborígene, africana e de outras etnias na concepção de vida, família, cidade, natureza e espaço público.
Pra isso é fundamental antes de mais nada sairmos da idealização hegeliana que acomete as ideias anarquistas a partir de um sem número de crossover teóricos que bebem no anarco individualismo e geram uma confusão dos diabos no estabelecimento de práticas anarquistas.
É fundamental produzir um acúmulo de práxis e teoria que rediscuta que transporte queremos nas cidades, que educação queremos nas cidades, que relação entre homem e natureza queremos nas cidades.
Em um mundo onde a dita natureza está se tornando mitologia, ser parte da expansão da ocupação humana em seu interior não me parece outra coisa senão o caminho da expansão das fronteiras do desenvolvimento produtivista travestida de douração de pílula naturista.
Em um mundo mais urbano que rural o fundamental é menos o isolamento idealizado espiritualista que nega a cidade e mais a integração nas inúmeras cidades, de todos os tamanhos, de perspectivas transformadoras de seu dia a dia. Ou seja, é prioritário refundar as cidades e a ideologia hegemônica nelas.
Para combater a carrocracia é fundamental o exercício da pressão para a ampliação de transporte público por trilhos movido a energia renovável e do uso de bicicletas.
É fundamental estabelecer parâmetros ecológicos para a construção de moradia que resolva o deficit habitacional.
É fundamental reler a cidade, entendendo que favela é cidade, periferia é cidade. É central discutir a descentralização habitacional, de decisões sobre energia e consumo, de debates sobre mobilidade urbana, de decisões sobre alimentação.
Para combater a concentração urbana é fundamental debater a descentralização urbana, da distribuição de alimentos; é preciso debater as distâncias entre a produção e o consumo; é preciso discutir o consumo e a relação com a tecnologia; é fundamental debater ciência, economia, cultura; É preciso nos livrar da hierarquização de direitos estabelecidos na distribuição econômica da população na geografia das cidades.
Como fazer isso se nos isolamos em comunidades ou estabelecemos uma ideia pirotécnica de anarquia como estilo de vida?
Enquanto construímos uma ideia de ecologia que rima como alienação pequeno-burguesa, outros coletivos se constituem como ferramentas concretas de enfrentamento ao estado e à institucionalidade e não construímos uma face ecológica para este combate.
Por que em vez de nos isolarmos uns dos outros não estabelecemos pontes que integrem o debate sobre a cidade ao debate contra hegemônico mantido por esses coletivos?
As cidades não serão enfrentadas ou reformadas com a ausência dos anarquistas nos debates e nas práticas de sua transformação.
Ao nos colocarmos como eco-anarquistas distanciados dos debates das periferias das grandes cidades construímos de tudo um pouco, menos o necessário meio de enfrentamento ecológico que pode levar à transformação do mundo.
Pra mudar o mundo é preciso menos negá-lo e mais mudá-lo.
Uma dica de cultura – V Festival Pachamama de cinema de fronteira
#Brasil – desde o passado dia 9/11 está rolando o V Festival Internacional Pachamama – Cinema de Fronteira 2014. O festival tem como objectivo ou realizar o intercâmbio cultural entre o Brasil e os países vizinhos, Peru e Bolívia.
Mais de 30 convidados nacionais e internacionais, 58 exposições de curtos e longas-metragens realizados em 6 espaços diferentes da cidade de Rio Branco (AC). Além disso, a programação conta com shows, provas ao ar livre e rodas de palestras e oficinas. É totalmente gratuito 🙂
Acompanhe a cobertura: Festival Pachamama – Cinema de Fronteira
Erdoğán e Barzani buscam enganar a imprensa
Os Estados Unidos têm pressionado a Turquia, país membro da OTAN, durante semanas para que faça mais por Kobane
Por Michael Rubin
6 de novembro de 2014
Fonte: Diário Siglo XXI
Tradução: Coletivo Anarquia ou Barbárie
Os peshmerga curdos iraquianos atravessaram a Turquia a caminho de Kobane, o cantão curdo-sírio atualmente sitiado pelo Estado Islâmico. O The New York Times informa que os “Líderes curdos sírios de Kobane afirmam que pequenos grupos de guerrilheiros não são suficientes para reverter a situação atual”, mas a Turquia tem o benefício da dúvida, e continua:
“Os Estados Unidos têm pressionado a Turquia, país membro da OTAN, durante semanas para que faça mais. Mas a Turquia tem se esforçado em solicitar que a intervenção americana busque depor o presidente sírio Bashar al-Assad, manifestando grandes reservas quanto à ajuda às minorias curdas da Síria e Iraque, alinhadas com as suas próprias populações curdas descontentes. Os grupos que combatem pelo município de Kobane entendem a política por trás da recente decisão turca de lhes ajudar a repelir o Estado Islâmico. Os analistas apontam que a minimização desse descontentamento na Turquia seja importante.”
Tais matérias interpretam mal a dinâmica curda ou os reais interesses do presidente turco, Erdoğán. Quando Erdoğán pensa a Síria, o inimigo número um a bater é Assad, o número dois são os curdos sírios e, apenas num distante terceiro lugar, o Estado Islâmico. Durante os últimos meses, Erdoğán esperava que o Estado Islâmico fizesse o trabalho sujo por ele, derrotando os curdos sírios. Entretanto, duas coisas aconteceram: as Unidades Populares da resistência em Kobane (YPG e YPJ) não apenas não se renderam como também poderiam até ter revertido a situação; e os Estados Unidos decidiram ignorar a proibição de cooperar com tais Unidades e as abasteceu, na prática, armando pela primeira vez o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK). Erdoğán jogou suas cartas, e os EUA, por fim, viu a luz no fim do túnel. Ao permitir que os curdos cruzem sua fronteira – mesmo como um gesto simbólico – a intenção de Erdoğán não é exatamente ver uma vitória dos curdos, mas sim impedir que os EUA voltem a colaborar com o PKK.
Erdoğán não é o único a se mostrar hostil aos curdos sírios. O presidente do Curdistão iraquiano, Massoud Barzani, também. Barzani desfaz-se em elogios ao nacionalismo curdo, porém os antecedentes pesam. Barzani almeja, antes de tudo, aumentar seu poder pessoal. É totalmente a favor do nacionalismo curdo desde que seja ele quem mande. Contudo, preferiria ver o fracasso da empreitada curda ao se ver substituído por um rival. Em 1996, por exemplo, ele arriscou tudo o que os curdos haviam conquistado até então, ao chamar a Erbil ( capital do Curdistão iraquiano) a Guarda Republicana do então Presidente Saddam Hussein para que este o apoiasse em seu enfrentamento ao líder curdo rival, Jalal Talabani. Atenção: apenas oito anos após o regime de Saddam ter utilizado seu arsenal de armas químicas contra os curdos.
Barzani considera os curdos sírios como rivais políticos, tendo em vista que estes pendem mais para o lado do líder do PKK, Abdullah Öcalan, do que ao seu. Em visita ao Curdistão sírio no início deste ano, Barzani bloqueou ativamente a ajuda humanitária requerida pelos curdos sírios. Toneladas de medicamentos doadas em solidariedade aos curdos de país vizinho foram “esquecidas” em seus armazéns. Todavia, a salvação dos yazidis de Shingal por parte das Unidades Populares – depois que os próprios peshmerga de Barzani tinham fugido – não fez senão destacar ainda mais a relevância das Unidades Populares aos olhos dos curdos. Em outras palavras, se o Estado Islâmico cortasse as asas das Unidades Populares, Barzani não derramaria sequer uma lágrima.
O envio de um contingente simbólico de peshmergas curdos a Kobane é simplesmente o plano de contingencia de Erdoğán e de Barzani. Para as Unidades não faz nenhuma diferença, e a sua defesa de Kobane apenas tem aumentado sua fama. Adicionar os peshmerga iraquianos à mistura não vai mudar os rumos do combate, mas permitirá que Erdoğán e Barzani reivindiquem a vitória dos curdos sírios caso as Unidades consigam realizar tal façanha. Basicamente, Erdoğán e Barzani esperam se beneficiar da ação das Unidades Populares e compartilhar sua glória.
Os EUA podem querer derrotar o Estado Islâmico, mas não devemos ter dúvidas: o Estado Islâmico não teria chegado até aqui se não fosse pela cumplicidade da Turquia e, mais especificamente, do próprio Erdoğán. Seria um erro fatal dos legisladores estadunidenses, ao tratar de Kobane, supor que o resto da região compartilha do nosso programa. Isso não significa que não podemos ter aliados de conveniência, mas não devemos vê-los como algo que não são.
Um filme… – Emma Goldman (2004) Legendado
Uma Declaração… – Chomsky sobre o aquecimento global
Uma entrevista…. – David Graeber – Anarquismo, democracia e protestos
Núcleo Nova Santa Quitéria – PR
Fonte: Movimento de Organização de Base
A Nova Santa Quitéria é uma ocupação urbana localizada no Bairro Santa Quitéria de Curitiba. Também conhecida como Portelinha 2 é vizinha da Portelinha e tem a situação do terreno igual a da comunidade vizinha. Desde 2006 centenas de famílias lutam por moradia digna e regularização.
Neste ano de 2014 os moradores estão construindo uma Associação de Moradores ativa e de luta, em que o MOB está presente.
Ciranda Espertirina Martins
A partir do segundo semestre de 2014 o Movimento de Organização de Base – Paraná em conjunto com o Coletivo Quebrando Muros estão construindo a Ciranda Espertirina Martins. De segunda à sexta, das 8 hrs ao meio dia, militantes do MOB, CQM e voluntários organizam várias oficinas em conjunto com as crianças da Nova Santa Quitéria e Portelinha.